O medo do fracasso é a
estagnação. Torna-nos morosos e lânguidos: pobres coitados à mercê de Deus. A
piedade miserável que temos para conosco representa o sentimento mais ignominioso
que existe entre nós, seres humanos. Amantes da podridão, somos animais complacentes com a própria alma pútrida e abatida. No final do dia,
prostramo-nos cansados e esperamos que alguém acaricie-nos os cabelos com
ternura e diga:
-Esforçaste-te com todo
teu ser. Estás livre para deitar-te de consciência tranquila, porquanto deste
de ti o melhor.
Impõem-nos desejos e
vontades, enchem-nos de promessas e nos fazem desejar o amor de todo o mundo e
a resplandecência característica daqueles que vivem no topo. Mimam-nos com seus
carros sumptuosos, com suas mansões ingentes e com a glória da televisão. Vestem-nos
com todos os sonhos burgueses, vendem-nos a felicidade por outdoors e nos induzem a acreditar que um dia, credores por nosso suado esforço, transgrediremos a
linha que separa a utopia da existência. Posteriormente, surram-nos a face com
a realidade e nos ridicularizam com a ignomínia do fracasso, para logo em
seguida nos encherem de terna esperança por meio de livros de autoajuda.
E acreditamos, sempre
fiamo-nos na ideia de que demos nosso melhor quando, em verdade, oferecemos
migalhas. Somos crianças à espera de que algo ou alguém intervenha por nós,
porquanto, sozinhos, o medo de fracassar nos faz pusilânimes.
-Ele interverá, minha
criança. Dar-te-á tudo o que tanto deseja e há de tornar-te alguém.
Deus: a mais brilhante criação
da burguesia. Por seu intermédio, a sociedade aterroriza e castra a todos. Não
somos mais que cobaias acovardadas pelo céu e o inferno. Divinizamos a moral e
demonizamos a imoralidade. Cremos fielmente no bem e no mal, no certo e no
errado, na conquista e no fracasso. Não temos audácia para lutar sozinhos pelo
que deveras ambicionamos e nos prostramos derrotados por aspirações fúteis e
frustradas que não são nossas. O que desejaste para ti?
Dissipamos o dia em
antros de imbecilidade, entusiasmados com fotos de coelhinhos, gatinhos e
ursinhos. Não existe o mero resquício de agressividade, qualidade primordial e
inescusável para enfrentar o mundo e abocar aspirações. Não, somos criaturas
oprimidas e aviltadas, distraídas com o que é aprazível aos olhos. Mendigamos
aprovação e admiração: disto nossa frágil confiança depende.
Rastejamo-nos como
vermes. Somos inundados por desejos alheios e manipulados por mentiras
asquerosas: o livre arbítrio é a pior delas. Perdemos o laço com a natureza
selvagem, porquanto passamos a acreditar em sua benevolência e misericórdia.
Somos criaturas castradas, abatidas e solitárias. Distraímo-nos com o que é
terno e cativa, com o que nos prometem nos anúncios de televisão, com vitrines
repletas de vislumbres. Desviam-nos o olhar enquanto somos violentados. Exsudamos
de medo, tememos não fazer jus às expectativas que pesam drasticamente sobre
nós. Não abocanhamos vigorosamente as ambições que são verdadeiramente nossas,
mas mendigamos e choramos por desejos fúteis que nos venderam, que nos disseram render
glória e prestígio. Receamos não ser alguém. E assim, cingimo-nos de eterna
monotonia.